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Fernando Pessoa

12. Amor

Quando os sentimentos morrem, já não os sabemos recordar.
[ilustração: Almada Negreiros. Desenho. in Athena nº2, 1924.
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«Choro não me poder lembrar com saudade do tempo em te amei.»

Eu no tempo não choro que me leve

A juventude, o já encanecer

A cabeça que pouco ainda esteve

Sob o Sol solto e a tarde a arrefecer.

 

Nem choro que não me ames, que faleça

O amor que vi em ti, que também haja

Uma tarde do amar, que desfaleça

E a noite fique, (...)


Mais que tudo choro já não te amar,

Sim, choro a tragédia de não ser o mesmo na alma,

De te ser infiel sem infidelidade,

De me ter esquecido de ti sem propriamente te aborrecer.

 

Não é o tempo ido em que te amei que choro.

Choro não te amar já por isso ser natural.

Choro ter-te esquecido, choro não me poder lembrar

Com saudade do tempo em que te amei.

 

Isso é que choro, sim, com as verdadeiras lágrimas

Que contém em si os piores mistérios —

A morte essencial das coisas,

O acabar das almas, mais grave que o dos corpos,

O abismo onde a única esperança é poder haver Deus

E um outro sentido desconhecido a tudo que se teve e se foi

Um outro lado, nem côncavo nem convexo à curva da vida.

29-9-1920

Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.

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