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Fausto

3. Universo

Deus e o universo são ilusão e não a verdadeira realidade.
[ilustração: Carlos Calvet. «Fausto». Desenho s.d.
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«Esse Deus, com seu universo real e eterno, é um átomo num mundo de universos.»
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Em Mim

Paro à beira de mim e me debruço...

Abismo... E nesse abismo o Universo

Com seu Tempo e seu Espaço é um astro e nesse

Abismo há outros universos, outras

Formas de Ser com outros Tempos, Espaços

E outras vidas diversas desta vida...

O espírito é antes estrela... O Deus pensado

É um sol... E há mais Deuses, mais espíritos

Doutras maneiras de Realidade...

E eu precipito-me no abismo, e fico

Em mim... E nunca desço... E fecho os olhos

E sonho — e acordo para a Natureza...

Assim eu volto a Mim e à Vida...

Inclino o meu ouvido para mim

E escuto... Um Deus Real e Verdadeiro

Criou nosso universo em sua dupla

Unidade divina de corpo e alma... E esse

Deus, com seu Universo real e eterno,

É um átomo num mundo de universos.

Inextricavelmente

Há outras realidades.

É saber isto que me faz alheio

À vida e pálido entre a humanidade...

Deus a si próprio não se compreende.

Sua origem é mais divina que ele,

E ele não tem origem que as palavras

Possam fazer pensar...

Fecha as portas da Alma! Faze ruído!

Agita, grito, o teu externo Ser,

Encobre-me a Presença do Mistério!

Pode ser que mundo possuamos

Um paraíso eterno, e vida divina

Seja (ó relâmpago do pensamento!)

A realidade! A ilusão talvez

Dure pra sempre... Quem criou um átomo

Ainda por criar

Pode criar uma ilusão eterna...

Altitude! Altitude! Não respiro!

Passei além da Realidade, ergui-me

Acima da Verdade... Deus... O Ser

O abstracto ser em sua abstracta ideia

Esse próprio, o mesmo sonho divino (?(

Apagou-se e eu fiquei na noite eterna

Eu e o Mistério face a face...

6-11-1912

Fausto - Tragédia Subjectiva. Fernando Pessoa. (Texto estabelecido por Teresa Sobral Cunha. Prefácio de Eduardo Lourenço.) Lisboa: Presença, 1988.

 - 70.

1ª versão inc: “Primeiro Fausto” in Poemas Dramáticos. Fernando Pessoa. (Nota explicativa e notas de Eduardo Freitas da Costa.) Lisboa: Ática, 1952 (imp.1966. p.83).