Ocultismo
23. Perigo
anterior seguinte | |
«Os caminhos do simbolismo são cheios de ilusões, de devaneios e de fraudes.»
|
Átrio.
O caminho dos símbolos é perigoso, porque é fácil e sedutor, e é particularmente fácil e sedutor para os de imaginação viva que são precisamente os mais fáceis de induzir-se em erro e, também, de romancear para os outros, formando fraudes por vezes inocentes, por vezes um pouco menos que isso. Nada há mais fácil que interpretar qualquer coisa simbolicamente; é ainda mais fácil que interpretar profecias.
Sucede, ainda, que os grandes símbolos são relativamente simples, prestando-se assim a uma série infinita de interpretações Figure-se o leitor, imaginando, quantos valores simbólicos se não poderão atribuir às duas colunas no átrio do Templo de Salomão, ou, aliás, a quaisquer duas colunas em qualquer parte. Tudo quanto, na vida ou no sonho, é composto de uma dualidade — e quase tudo na vida ou no sonho envolve uma dualidade qualquer —, tudo isso se pode supor simbolizado por aquelas duas colunas. Elas, porém, não podem destinar-se a simbolizar tudo quanto se queira. Algum, ou alguns, hão-de ser os veros sentidos íntimos delas. O que se pergunta, pois, é isto: que critério temos nós para determinar, entre tantos símbolos possíveis, quais são os que são deveras aplicáveis, os verdadeiros?
Para isto existe o critério do quíntuplo sentido: cada coisa tem na simbólica, cinco sentidos; e esses cinco sentidos estão uns dentro dos outros, sendo cada um o desenvolvimento do anterior. Quando Pike diz que há, para a maioria dos símbolos maçónicos quatro atribuições distintas, diz bem, pois, como é de ver, exclui o sentido literal, ou profano, que é o primeiro dos cinco e não entra na consideração dele. Quando, porém, passa a dizer que um é o sentido moral, outro o político, vai mal, pois que o sentido político não é o desenvolvimento do sentido moral, mas uma coisa de outra ordem.
Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética - Fragmentos do espólio . Fernando Pessoa. (Introdução e organização de Yvette K. Centeno.) Lisboa: Presença, 1985.
- 51.“Átrio”