Filosofia
10. Platonismo
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«Toda a filosofia dos místicos cai por este alçapão.»
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António Mora:
TEORIA DO DUALISMO
A «realidade» — num sentido mais lato do que se permite — divide‑se em duas categorias: a Consciência e a Realidade. Uma é o com que se «percebe» o mundo exterior; outra é esse próprio mundo exterior.
A filosofia pecou de duas maneiras: (1) tomando a ideia de individualidade por sinónima com a ideia de Consciência — de onde os erros metafísicos da imortalidade da alma , da existência da alma individual ; (...) (2) tomando a ideia de individualidade por sinónima com a ideia de Realidade — de onde erros como a ideia de Natureza (conjunto exterior).
Toda a filosofia é um antropomorfismo. O erro fundamental é admitir como real a alma do indivíduo, o erigir a consciência do indivíduo em consciência absoluta e a Realidade em individualidade. lndividuar a Realidade — eis o primeiro grande erro. Individuar a Consciência — eis o segundo grande erro.
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As teorias filosóficas enfermam dos erros seguintes:
(1) O erro antropocêntrico ou antropomórfico, que consiste em atribuir, quer à Realidade, quer à Consciência, qualidades que pertencem simplesmente à Individualidade.
(2) O erro de atribuir à Consciência qualidades atribuíveis só à Realidade: o erro realista.
(3) O erro de atribuir à Realidade qualidades que pertencem, ou se podendo conceber como pertencendo, apenas à Consciência; o erro animista.
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A arte é essencialmente Erro.
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A ideia de Deus é um antropomorfismo da Consciência. É atribuir individualidade à Consciência.
A ideia de Natureza é um antropomorfismo da Realidade. É atribuir individualidade à Realidade.
O facto é que só se pode atribuir individualidade a uma coisa — à individualidade.
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Pascal, quando disse que colhemos apenas «quelque apparence du milieu des choses» foi generoso para com a nossa ignorância. Nem desse sonho de sapiente nos podemos, homens, orgulhar.
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Todo o nosso trabalho mental orienta‑se sobre 3 ideias que sem cessar confunde e mistura:
(1) a ideia da Consciência.
(2) » » » Realidade.
(3) » » » Individualidade.
(1) O erro egomórfico.
(2) O erro de atribuir à C[onsciênci]a qualidades que pertencem apenas à realidade: — a mera afirmação, em aparência de todo incontrovertível, de que a C[onsciênci]a existe. Não temos direito racional a afirmá‑lo. O que podemos afirmar sem erro é que a Consciência é a Consciência; mais nada.
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«Toda a filosofia dos místicos cai por este alçapão».
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Os 6 erros da filosofia metafísica:
1. Atribuir à C[onsciênci]a as «qualidades» da R[ealidade].
2. Atribuir à C[onsciência] as «qualidades» da I[ndividualidade].
3. Atribuir à R[ealidade] as «qualidades» da C[onsciência].
4. Atribuir à [Realidade] as «qualidades» da I[ndividualidade].
5. Atribuir à I[ndividualidade] as «qualidades» da C[onsciência].
6. Atribuir à I[ndividualidade] as «qualidades» da [Realidade].
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A essência da filosofia platónica consiste em cindir a «Realidade» em duas partes: as coisas sensíveis, isto é, as que caem sob a percepção dos sentidos, e que constituem a Matéria, aquilo que é composto de partes, e que é mutável, perecível e concreto; e as coisas inteligíveis, isto é, as que caem sob a percepção da Inteligência, e que são as ideias e as noções, aquilo que se não compõe de partes, que é imutável, imperecível, e abstracto. É sobre estes alicerces que Platão e os platonistas erguem a diversidade semelhante dos seus sistemas idealistas. Escusamos de os seguir nos seus vários caminhos, que partem em leque deste ponto de origem. Basta que, em um traço, verifiquemos o erro fundamental do sistema‑fonte . Ele consiste (esse erro) em atribuir às ideias abstractas as qualidades que a Experiência nota nas coisas concretas, em ligar à Consciência os atributos da Realidade. Mas não é bem à Consciência que a atribuição é feita. É a elementos da Consciência com carácter já de entidades, ou entes, exteriores. O processo aqui é mais complexo se bem que ceda sem consistência a uma análise que o aperte.
A Individualidade — toda a Individualidade — contém 3 elementos: (1) a individualidade propriamente dita; (2) a (re)presentação individual da Realidade — isto é, a Realidade passada através do sistema nervoso individual; (3) a abstracção — isto é, o trabalho que a individualidade faz sobre esses elementos presentativos, quer dizer, a Realidade passada através do sistema nervoso superior .
Textos Filosóficos . Vol. I. Fernando Pessoa. (Estabelecidos e prefaciados por António de Pina Coelho.) Lisboa: Ática, 1968 (imp. 1993).
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