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Vida e Obra

4. Férias

Em 1901/02 passa um ano em Portugal e escreve sozinho jornais em que participam diversos heterónimos seus.
[ilustração: Fernando Pessoa aos treze anos.
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        Para música (Fragmento)

QUANDO ELA PASSA

Quando eu me sento à janela

P'los vidros qu'a neve embaça

Vejo a doce imagem d'ela

Quando passa... passa.… passa...

N'esta escuridão tristonha

Duma travessa sombria

Quando aparece risonha

Brilha mais qu'a luz do dia.

Quando está noite ceifada

E contemplo imagem sua

Que rompe a treva fechada

Como um reflexo da lua,

Penso ver o seu semblante

Com funda melancolia

Qu'o lábio embriagante

Não conheceu a alegria

E vejo curvado à dor

Todo o seu primeiro encanto

Comunica-mo o palor

As faces, aos olhos pranto.

Todos os dias passava

Por aquela estreita rua

E o palor que m'aterrava

Cada vez mais s'acentua

Um dia já não passou

O outro também já não

A sua ausência cavou

Ferida no meu coração

Na manhã do outro dia

Com o olhar amortecido

Fúnebre cortejo via

E o coração dolorido

Lançou-me em pesar profundo

Lançou-me a mágoa seu véu:

Menos um ser n'este mundo

E mais um anjo no céu.

Depois o carro funério

Esse carro d'amargura

Entrou lá no cemitério

Eis ali a sepultura:

Epitáfio.

Cristãos! Aqui jaz no pó da sepultura

Uma jovem filha da melancolia

O seu viver foi repleto d'amargura

Seu rir foi pranto, dor sua alegria.

Quando eu me sento à janela

P'los vidros qu'a neve embaça

Julgo ver imagem dela

Que já não passa... não passa.

15-5-1902

Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa . Teresa Rita Lopes. Lisboa: Estampa, 1990.

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